A ORNITOFILIA E A SOCIEDADE.
A criação de pássaros em cativeiro, envolve muitas das vezes alguns preconceitos naturais, daqueles que vêem uma contradição na manutenção dos pássaros em gaiolas. De fato, a primeira impressão é a de que essas aves mantidos em espaços reduzidos, deveriam estar em liberdade. Estes conceitos, vão mudando de ótica, quando nos aprofundamos verdadeiramente na análise histórica e ecológica do porque desse longo processo de interação homemanimal ao longo dos séculos.
As nossas origens, desde o tempo das cavernas, foram de uma total integração com a Natureza, e o prazer do convívio com diversas formas de vida, está inserido profundamente no nosso comportamento e estrutura genética. Resulta incrível verificar, que os próprios aborígines, no meio da mais intacta Natureza, tenham seus próprios animais de estimação, numa interação que está em nossas veias. Negar essa necessidade humana, significa desconhecer uma realidade inegável. Na sociedade moderna e urbana é difícil imaginar qualquer ambiente, seja ele profissional, comercial ou doméstico, onde não haja um jardim, um animalzinho de estimação, ou uma foto sequer de um ambiente natural. O homem foi se aglutinando em grandes metrópoles, mas manteve intactas as suas necessidades de contato com a Natureza, gerando um mercado que hoje chamamos de "Pet", que nada mais é do que um enorme universo de opções animais disponíveis para nos fazer companhia. Estatisticamente, o mercado Pet é o que mais cresceu no Mundo nas últimas décadas, o que vem à comprovar que por mais agitada que a vida moderna seja, por mais concentrada a "selva de pedra", e mesmo com o impressionante avanço tecnológico, de comunicação e entretenimento, o ser humano mantém uma fisiológica necessidade de contato com outras formas de vida. Esta situação, acarreta um risco eminente de agressão ao meio ambiente, pois alguns dos animais escolhidos pelo homem (os pássaros principalmente) são capturados ilegalmente da Natureza, e comercializados pelo tráfico especializado, que depois dos entorpecentes e das armas, é o que mais mobiliza recursos no Mundo.
PÁSSAROS, ECOLOGIA E PROTEÇÃO AMBIENTAL A extinção das espécies, ou sua drástica diminuição populacional se deve basicamente a 4 fatores:2- Destruição do Habitat Natural4- Fiscalização inadequada.O sucesso da criação de animais domésticos em cativeiro é tal, que inúmeras espécies estão tão difundidas que longe de sofrer qualquer ameaça de extinção, são reproduzidos aos milhões todo ano, ficando assim isentas da acão fiscalizadora sobre elas. Quem quiser criar qualquer animal doméstico, não precisa realizar qualquer tramitação junto ao IBAMA. É evidente no entanto, que até se tornarem "domésticas" milhares de abnegados criadores passaram por centenas de anos aprimorando os métodos de reprodução, manejo, sanidade, nutrição, etc. etc.Tal foi essa adaptação, que se fossem os colocados subitamente no meio selvagem dos nossos ancestrais, a nossa chance de sobrevida seria praticamente zero, da mesma forma que os animais que acompanharam o homem e hoje estão dentro da gaiola,canil ou baia, livres do stress, das inclemências do tempo e dos predadores, não tem chances de sobrevida na Natureza.Cada pássaro que se cria na gaiola, ocupará certamente o lugar de outro que seria retirado da Natureza. E uma contribuição direta para o desestímulo ao tráfico.1- Emissão de produtos poluentesNo caso específico da Caça Predatória, uma das formas mais eficazes de minimizar esse problema, é o estímulo à criação em cativeiro das espécies mais procuradas pelo homem. Dessa forma, e ao longo dos séculos, algumas espécies avançaram tanto nesse sentido, que se viram livres dessas ameaças tendo em vista o enorme sucesso do homem na sua reprodução em confinamento. Surgiram assim, as espécies chamadas de "domésticas", tais como cães, gatos, galinhas, cavalos, canários, pombos, diamantes, etc. etc.No caso específico dos pássaros, por estarmos ainda num período de intenso tráfico, destruição constante dos habitats naturais, fiscalização deficitária por falta de recursos, etc. a criação em cativeiro tem um apelo ecológico Fundamental, que entendemos merecedora de mais estímulo por parte das autoridades.3- Caça predatóriaAssim como o homem passou de um estado chamado de "selvagem" para outro de "civilizado", onde passou pela adaptação de uma vida em grandes áreas e baixíssima concentração populacional à se adaptar a viver em pequenos apartamentos de alguns metros quadrados, e trabalhar em verdadeiros cubículos, se transportar literalmente comprimidos em meios de transporte subterrâneos, sem sequer ver muitas vezes a luz do dia, os animais também passaram por essa adaptação, de "silvestres" para "domésticos".
ALOJAMENTO
Existem alguns sinais claros de estresse por alojamento inadequado, espaço, temperatura, iluminação, etc. etc. O principal, é o insucesso na reprodução. As aves somente se predispõem à reprodução quando estão perfeitamente adaptadas ao mesmo, e seu nível de estresse é muito baixo. A disposição para o canto também representa um claro sinal de adaptação. A aparência sanitária, demonstra também que a ave está alojada em lugar apropriado. Não é preciso grandes conhecimentos e experiência para percebermos se uma ave encontra-se à vontade no seu alojamento. É incrível a sensibilidade natural que as pessoas têm, mesmo leigas, para perceberem a adaptação ou não de um animal no seu alojamento. Se olharmos o tamanho das baias dos cavalos, dos canis, dos pombais, etc. etc., sentiremos em primeira instância, a sensação de serem locais inadequados, sentimento este fruto do desconhecimento de que a transformação de "selvagem" em "doméstico" significa perfeita adaptação à espaços reduzidos sem qualquer reação de estresse. Todos nós, humanos e os animais que ao longo da história nos acompanharam, trocamos o ar livre, as grandes áreas, a intensa atividade, a busca tenaz pelo alimento, a constante luta contra o frio e o calor, os predadores, etc. etc., pelo conforto das cidades, com os alimentos ao alcance da mão, a água na torneira, a proteção das inclemências, etc. etc. Isto fatalmente, representa adaptação à espaços reduzidos. Não poderíamos deixar de mencionar nesta análise, a experiência secular sobre este tema que os países europeus ostentam. No velho continente, onde a consciência ecológica é muito desenvolvida, a legislação é muito cuidadosa nesse sentido e os estudos de inúmeras gerações permitiram conclusões muito acertadas, o alojamento dos animais está perfeitamente equacionado e as gaiolas de exposição atendem perfeitamente as necessidades de cada espécie, sem exigências de espaços muito grandes. Nas exposições de canários roller (Serinus canários) para citar uma espécie que se expõe na Europa e no Brasil, o tamanho da gaiola de exposição é de 30 cm de comprimento.
TRAFICANTES E CRIADORES
Existem no meio ornitófilo, 2 figuras opostas nos seus comportamentos, postura ética e interesses. 1-Caçadores e traficantes. 2-Criadores. Os caçadores e traficantes, pouco se sensibilizam com a beleza do canto ou da plumagem, pouco se importam com a vida, e visam apenas o lucro, sem medir as brutais conseqüências dos seus atos. Para eles, o bem estar das aves não conta, a alimentação dada é apenas para eles subsistirem sem causar "prejuízos" e é o lucro e tão somente o lucro o que os motiva. Já os criadores, sentem desde a sua infância o fascínio pelo canto e pela beleza, cuidam dos seus pássaros melhor do que a si mesmos, e estão dispostos a gastar altas quantias de dinheiro nas melhores opções de alojamento, alimentação, tratamento veterinário de seus pássaros. Se a sua ave padecer de qualquer mal, o incorporam como se fosse próprio. Ainda são poucos os representantes da sociedade que conseguem efetivamente diferenciar esses 2 grupos antagônicos no seu comportamento, antagônicos nos seus princípios, antagônicos nos seus interesses, e definitivamente antagônicos na sua contribuição ecológica. Os criadores ornitófilos pertencem ao grupo daqueles que, não sendo fiscais do governo, não podendo frear o desmatamento, e nem controlar o uso indiscriminado dos agrotóxicos, e ainda terrivelmente estigmatizados, saem da simples retórica, para, com fatos concretos, buscar na reprodução em cativeiro, uma forma de amortecer esse terrível mal do tráfico e a depredação. É muito difícil aceitar os inúmeros adjetivos pejorativos que se fazem a essa classe que é amiga e não inimiga, que protege e não destrói, que multiplica a vida enquanto outros a dizimam. Inúmeras espécies estão livres de ameaça graças ao trabalho de alguns abnegados que conseguiram a sua reprodução em cativeiro. Temos total consciência da dificuldade que representa para as autoridades, distinguir o traficante do ornitófilo, como também para todos nós cidadãos é extremamente difícil se não impossível, distinguir o político honesto do corrupto, mas nem por isso a solução será colocar todos no mesmo conceito e classificação.
DOS TORNEIOS
O torneios e exposições são meios de confraternização e divulgação do trabalho realizado. Tanto nos concursos de exemplares de cor como os de canto, um alojamento inadequado representará fatalmente no mau desempenho tanto do visual como do canto do exemplar. Existem inúmeras pessoas que dedicaram a sua vida inteira ao estudo das técnicas de transporte e alojamentodas aves para obter delas o máximo do seu potencial, e certamente esse já seria argumento mais do que suficiente para entender que nós mais do que ninguém queremos encontrar esse bem estar. Ninguém mais interessado do que o próprio expositor em obter o melhor resultado do seu exemplar, e parece óbvio que um alojamento desconfortável e inadequado, representará num desempenho ruim. Fonte: Artigo Publicado por Álvaro Blasina na Revista Brasil Ornitológico 67